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11 setembro, 2025

Leandro dos Reis Muniz - Autor de: APONTAMENTOS PARA M.

Leandro dos Reis Muniz

O nome do autor é Leandro dos Reis Muniz, natural de Salvador (BA) e poeta de alma, também é psicólogo de formação e profissão. Cedo viveu a paternidade e todas as agruras do mercado de trabalho, que um dia quer chamar de mundo do trabalho, porque há nele um quê de educação, mas foram tempos de dureza, de vivenciar os dramas sociais e psíquicos de ser um pai juvenil. Porém, ao mesmo tempo, pôde vivenciar o ânimo arrebatado da maravilha de ser pai. Muito por isso, considera-se uma contradição que se resolve na própria labuta da existência, cheia de retrocessos de si e engates de si mesmo. Porque é assim a vida, dura, e com tempos de suavidade, mas ele é arredio, e com ela abre-se na sua própria abertura. Refazer-se é um imperativo já piegas, comprometer-se em ser aquilo que sente que se é no tempo, na relação e no contexto, na presença, em que é resoluto em si, e possa estar vivaz nas horas, ainda que poético na melancolia, na seriedade e na alegria.

Apontamentos para M.
O inefável foi sentido no corpo, e, justamente por isso, é do corpo, não está elevado aos céus, ainda que continue transcendental, ainda que se sugira o divino pelo tamanho impacto inexprimível. Porém, não estamos em tempos medievais. Singularmente, a vivência trouxe um quase-quê, aquilo que na ponta da língua é impossível de tradução, mas que impulsiona o fazer sentido, o ter de dizer. Afasia seria um nome significativo, se não tivessem adoecido a palavra, o fato é que o nó na garganta é propulsor das muitas palavras que concatenadas usam-se e formam o universo das relações e o concreto simbólico do mundo da linguagem. A proposta é que a mudez resoluta da inefabilidade é mãe de todo assobio comunicativo numa tentativa inócua de resgatá-lo pleno, assim como o homem quer seu ascenso ao paraíso após a queda, mas que sempre lhe faltará. O homem está condenado, não é nenhuma novidade, e caminha para a derrota taxativa, a morte, onde não poderá dizer uma mísera palavra nem escutar o seu silêncio abismal. Queria ele, ainda razoável, ter a expressão da experiência indizível, poder ler com verborreia uma página em branco, ser locutor do impossível, além dessa vívida imaginação que só parte adiante do primeiro A, e daí se faz todas as caraminholas possíveis no transcorrer dos tempos como novo, vanguarda ou tradição. E diante da experiência subjetiva do “não A”, ou seja, daquilo anterior à letra, o que não se concatena, o que não se significa, mas é pleno de significado porque toma todo o corpo e tampona qualquer ausência? O inefável? Seria um homem em perseguição disso, nem todos, é como cristicidade e cristandade, alguns comparecem à igreja, outros experimentam o divino. E se estivesse louco mudaria de alguma forma a sensação genuína do inefável no corpo? Óbvio que não, e é mais provável que esta subjetividade sui generis ocorra em estados não normóticos de vivência ou de contemplação do existir, não se poderia na rotina que traga um espírito em operações enfadonhas conseguir absorver em si uma sensação de totalidade inexplicável e inexprimível, ou na tagarelice do cotidiano ser tomado pela resolução absurda de uma alma que se sente repleta como se atingisse os céus. Mas incomum seria ter a certeza mais humana numa afasia que transcende o próprio ser por sentir-se ser absolutamente num turbilhão de mesmidade, em que a repetição pobre de espírito do comum parece ser a marca mais humana da humanidade pela sua recorrência.

ENTREVISTA

Olá Leandro. É um prazer contar com a sua participação na Revista do Livro da Scortecci

Do que trata o seu Livro?
O livro quer tratar do que não se diz ou do que não se pode dizer, o Inefável. Não é uma novidade se deparar com o que falta às palavras, mas, se antes era tratado como um atributo do divino, porque a linguagem não é capaz de se alçar a Deus, pretendo, poeticamente, trazer o inefável para a percepção, para o corpo, onde se sente a ausência das palavras, e, a partir do próprio sujeito, aquilo inexprimível torna-se um promotor do convite a fazer sentido. Como se houvesse uma convocação à linguagem, em que, diante do absurdo da existência e do nada a dizer, ela, a linguagem, promovesse um talhar existencial pela própria necessidade de se atrever a um encontro íntimo pelo exercício de si. Além disso, em Apontamentos Para M., há muitas poesias de vigor, que se estabelecem como um chamado para a necessidade de ser genuinamente.

Como surgiu a ideia de escrevê-lo e qual o público que se destina sua obra?
Apontamentos foi esboçado há um certo tempo, desde 2013, e ficou parece que ficou no aguardo de uma elaboração mais madura, ao mesmo tempo que mais simples. A ideia de escrevê-lo veio própria sensação absurdo do limite da linguagem, da inefabilidade, porém, parece que não me contentei com o vazio das respostas, e a poesia foi o caminho de expressão do inexprimível. Apontamentos é um pequeno livro de poesia que se destina a todo humano que se interroga, que se elabora, que se relaciona com o mundo e ainda se assombra, e que sabe, mesmo no difícil silêncio que se introduz no burburinho do cotidiano, que o viver autêntico é o que sobra como desejo altivo, embora imerso nos entraves de uma crise, que não se arrefece, entre ser si mesmo e estar para responder os anseios alheios de uma tradição.

Fale de você e de seus projetos no mundo das letras. O primeiro de muitos ou um sonho realizado?
Tenho escrito poesias desde muito jovem, faço livros com algum tema que atravessou meu espírito, afetou meu corpo, que foi convite para uma saída existencial, então a possibilidade de escrever mais e mais está sempre aberta. São as experiências que vivi e a necessidade de elaboração poética que me convocam à poesia. Sou pai desde jovem, trabalhei muito desde jovem, e, desde jovem, encontrei abertura para viver a rua, a comunidade humana, mas sempre carregando um estranhamento, uma certa inadequação, por isso, às vezes, afirmo que sou feito de contradições. Não foi à toa que me meti na Poesia, na Psicologia, agora na Filosofia, que fiz um mestrado em Educação Profissional e Tecnológica, esses temas estão na travessia da minha existência.

O que te inspira escrever?
Ainda que respire um ar melancólico de que o estado das coisas pareça irremediavelmente fatalista, ainda resta a sensação de que há alguma fresta, um rumo por onde possamos infiltrar uma ética, em que o exercício de ser se encontre com um futuro menos danoso. E a poesia, como forma simbólica potente, é capaz de alcançar corpos, consciências, que pretendam, radicalmente, a superação das mazelas do mundo. Desde muito jovem a diferença não consentida, a resignação e o ressentimento, a bobagem de se fincar no mundo pela má-fé das pequenas diferenças, o sofrimento pela impossibilidade de ser quem se sente que se é para responder aos ditames alheios e obsoletos infiltrados nas consciências, fazem com que a poesia seja uma resposta, um convite, uma necessidade de afrontar essas normas vazias e decantar contraconsciências, que são necessariamente críticas, para transmudar o estado das coisas do mundo.

O seu livro merece ser lido? O que ele tem de especial capaz de encantar leitores?
Apontamentos Para M. merece ser lido, não apenas pela ideia de trazer para o corpo aquilo que não se diz, mas pela convocação à autenticidade, pelas poesias vigorosas que convidam à altivez diante de um mundo que nos achata a expressão genuína de nós mesmos. É, antes de tudo, uma forma de estabelecer o possível quando tudo parece caminhar para o fatalismo da resignação e do sofrimento inescapável de se intrometer nas relações, cada vez mais, frívolas no mundo. Apontamentos é um alento, que pode soar antigo, mas não é isso, é perene, porque a exigência de superar em si a superfície atroz é histórica, dela não se furta. Assumir a responsabilidade pela própria liberdade, é uma ética que não perde o teor de fundamento do humano.

Como ficou sabendo e chegou até a Scortecci?
Publiquei Avulso pela Scortecci em 2021, outro livro de poesia, muito palatável. Foi feito com muito zelo e credibilidade pela editora, houve muito cuidado no desenvolvimento da obra. Isto me fez procurar a Scortecci novamente para publicar Apontamentos Para M., e a elaboração continuou com o alto nível, com respeito, com cuidado e com responsabilidade na formatação do livro. Pretendo publicar outro em breve, e será pela Scortecci, sem dúvida.

Obrigado pela sua participação.

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